... rua...
… rua morta, silêncio dos cemitérios, não passa gato, não ladra cão,
cinzentismo que s´abate, frio que se sente,
débil vestígio de gente,
uma porta, outra porta, tão fechadas,
tão caladas,
já não s´ouve ranger da loja, cantarolar do merceeiro, quantos, por trás de cada muro,
mistérios, paredes velhas que s´esfarelam, caliça que desagrega,
buracos...
por tantos lados,
tijolos caídos, lar, esconderijo
que ainda é abrigo...
d´espantar, tugúrio,
berço dos filhos, mau augúrio,
enrolado nas suas misérias, aguarda, resiste com seu infortúnio,
adoentado...
utiliza mente, maculada por macabras sensações, noite agitada, fazendo contas,
pensando
em algumas pontas,
sobras, incerto porvir, dia seguinte, vegetativo, sopa na cantina, não activo,
migalha de pão na gaveta...
resquício no fundo da proveta,
sem trabalho, sem dinheiro, sem interesse,
carpinteiro...
pensando no companheiro, pensando…
rua silenciosa, não passa,
destino de quem traça...
nem cão, nem gato, desacato, alcova em que s´enrola,
esmola...
carinho da mulher, amor que o consola, corpo a que s´encosta,
mal que reparte,
outra arte...
dádiva mútua, na luta que se prolonga,
alonga...
pertinho da escola, tão morta, com porta,
sem gente... demente,
recorda madrugada d´então, sorriso aberto, assobio lampeiro,
passo ligeiro...
graçola, canalha pequena, saltitante, corrida ao desafio,
irmão contra irmão,
desvario...
gargalhar contínuo, pardais à solta,
volta que não volta…
rua que não é rua, nem minha, nem tua,
sem lua...
noite sombria, manhã sem destino, na cama, sem chama,
na lama,
ninguém soa, sem café,.
ali ao pé,
cadeiras viradas sobre mesas, cerradas as portas,
quão mortas... imensas,
não t´importas, esqueces, recebendo esmolas, cantina social
com sopa, sem vida... vegetal,
ruas que eram movimento, no centro,
lamento...
comerciais com espavento, por fora, por dentro,
afanosas, nas compras,nas vendas, manhãs que eram encanto,
ocupação permanente, trabalhos, canseiras, suores, oficina como suporte,
sua sorte...
remuneração que era valia,
sorriso, simpatia...
equilíbrio perfeito, regresso a casa,
braços abertos, família, abrigo, refúgio na sua rua, café, ali ao pé,
amigos, conversas intermináveis,
louváveis,
normalidade d´então, fulminante situação,
inversão…
recordação na desocupação que lhe foi imposta,
olhando para o tecto, na cama,
sem chama...
na rua decomposta, com portas cerradas,
nas casas fechadas...
nas ruínas que são tugúrios,
maus augúrios,
sem filhos,
lá longe, triste PAÍS que se contradiz, sem esperança, sombrio,
desafio,
resistência perante… degradante… Sherpas!!!...